Renovável também feito de biomassa da cana já tem demanda de aéreas e entra no planejamento de produtores
O bioquerosene de aviação, conhecido como bioQAV, é o próximo dos combustíveis renováveis a entrar em planejamento industrial.
Etanol, biodiesel, biogás, biometano largaram na frente em um saldo que, no geral, faz o Brasil ser destaque global quando se fala em descarbonização.
Exemplo: em 2021, o consumo desses combustíveis renováveis reduziu as emissões de gases de efeito estufa, os GEEs, em 24 milhões de toneladas, relata a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Em termos comparativos, o volume representa 53% das 48 milhões de toneladas de poluentes emitidas pelos transportes no País nos dez primeiros meses de 2021, divulga a CNN Brasil.
Sendo assim, se os transportes terrestres fazem em parte sua lição de casa, também é hora de as aeronaves deixarem – ou reduzirem – as emissões de GEEs, responsáveis diretos pelo aquecimento global.
E é aí que entra o bioquerosene de aviação.
Energia Que Fala Com Você já tratou do tema – leia aqui -, mas em resumo trata-se de de um renovável produzido a partir de biomassas como a da cana-de-açúcar, bem como de óleos vegetais (como soja), gorduras animais e resíduos urbanos.
É um tipo de biocombustível que substitui o querosene de aviação (conhecido pela sigla QAV-1) e, por ser renovável, reduz a emissão de poluentes pelas aeronaves. Atualmente, os aviões e helicópteros utilizam QAV-1 ou gasolina de aviação (GAV).
No caso, o bioQAV entra como aditivo ao QAV-1.
É similar ao que já ocorre com a gasolina, que recebe 27% de etanol anidro, e com o óleo diesel, que tem 10% de biodiesel.
Quanto será o percentual de adição de bioQAV à querosene de aviação cabe a decisão dos técnicos integrantes do comitê ProBioQAV.
Foi criado em 2021 pelo governo com o objetivo de, também, inserir o renovável na matriz energética e no programa de Estado RenovaBio, que reduz as emissões de GEEs por meio do incentivo de uso dos biocombustíveis.
Além deste comitê técnico, o Brasil deu outro passo pelo bioQAV e desde novembro último conta com o Programa Nacional de Bioquerosene.
Segundo a Agência Câmara, o Programa é ancorado pela Lei 14.248/21, originada em projeto do Senado, aprovado em setembro pela Câmara dos Deputados (PL 9321/17).
Conforme a lei, o programa abrangerá o desenvolvimento de tecnologia para mistura do bioquerosene com o querosene de aviação, bem como o desenvolvimento de tecnologia que garanta a substituição total do combustível de origem fóssil.
A pesquisa, a produção, a comercialização e o uso do bioquerosene devem ser fomentados por meio de incentivos fiscais do governo federal e pela destinação de recursos federais, em condições especiais, relata a Agência.
Agora é torcer pela entrada na prática do bioQAV e mesmo de sustentáveis para a aviação como o SAF, que também pode ser produzido a partir de biomassas e a LATAM, por exemplo, já é candidata a ser consumidora.
Em postagem no Linkedin, Jerome Cadier, CEO LATAM Airlines Brasil, relata que a aérea pretende utilizar pelo menos 5% do sustentável até 2030.
Do lado dos produtores, o SAF entrou no radar da GranBio, que tem planta produtora de etanol celulósico em São Miguel dos Campos (AL).
Ela integra consórcio com as empresas Petron e Byogy para para construção de planta integrada de bioquerosene de aviação (SAF) de segunda geração.
O projeto foi aprovado em 2021 pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos, está orçado em US$ 3,8 milhões a serem liberados pelo órgão americano, relata o jornal Valor Econômico.
RETRANCA EXTRA
“Faltam políticas públicas de incentivo”
Para entender mais sobre o BioQAV no Brasil, entrevistamos uma das especialistas no assunto: Amanda Gondim, coordenadora da Rede Brasileira de Hidrocarbonetos e Bioquerosene Renováveis para Aviação (RBQAV) e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
O que falta para o bioquerosene de aviação deslanchar no Brasil?
Amanda Gondim – O Brasil tem disponibilidade de biomassa e Resolução da ANP que estabelece as especificações do querosene de aviação JET A e JET A-1, dos querosenes de aviação alternativos e do querosene de aviação C (JET C), bem como as obrigações quanto ao controle da qualidade a serem atendidas pelos agentes econômicos que comercializam esses produtos em território nacional.
No entanto, não há políticas públicas que incentivem e dêem previsibilidade de mercado para o investimento na construção de biorrefinarias.
O que tem sido feito?
Amanda Gondim – O Subcomitê ProBioQAV, do Programa Combustível do Futuro, lançado em abril de 2021, vem discutidos sobre políticas de inserção do bioquerosene de aviação na matriz energética com a participação de entidades representativas (stakeholders) e agências governamentais, pesquisadores de Universidades renomadas, fabricantes de aeronaves e companhias aéreas, especialistas internacionais e representantes de associações.
Outro ponto importante e necessário é o incentivo às pesquisas, desenvolvimento e inovação, pois somente através delas conseguiremos reduzir o preço do bioQAV.
Temos como quantificar o mercado de bioquerosene de aviação no Brasil? Segundo o sindicato Sindag, a frota de aviões agrícolas chega a 2.432, sendo que 996 são movidos a gasolina de aviação, 846 a etanol e 590 a querosene.
Amanda Gondim – Os aviões de pequeno porte, principalmente não tripulados, têm grandes chances de serem movidos a motores elétricos.
A substituição do bioquerosene para bioQAV já é possível até um percentual máximo de 50%, dependendo da rota de produção do bioQAV, sem qualquer alteração de motor.
As divulgações são de produção de bioquerosene a partir de hidrogênio (H2) e mesmo a partir de etanol de segunda geração. A tendência é de que as fontes do bioquerosene a ser produzido no Brasil sejam mesmo variadas?
Amanda Gondim – A tendência para o Brasil são rotas a partir de oleaginosas e gorduras, pois temos uma produção de óleo de soja, sebo e outras oleaginosas.
Para a segunda rota de produção para bioQAV, apostaria nos processo a partir do etanol .
Os combustíveis sintéticos, produzidos a partir de monóxido de carbono (CO) e hidrogênio (H2) são bem promissores, mas têm um custo mais elevado. No entanto, sua contribuição para mitigação GEE é maior.
No Brasil, é possível utilizar várias biomassas com suas respectivas rotas de produção, aproveitando as características de cada região do país.